Exames encontraram a bactéria
salmonela nos corpos de indígenas mortos
Foto: DW / Deutsche Welle
Quando Hernán Cortés chegou ao
México, em 1519, existiam entre 15 milhões e 30 milhões de indígenas na região
mesoameicana. No fim daquele século restavam menos de dois milhões. As guerras
provocaram muitas mortes, mas foram epidemias trazidas pelos invasores que
dizimaram a população. Em 1545, o povo da nação Asteca começou a adoecer com
febres altas, dores de cabeça e sangramento nos olhos, boca e nariz. A morte
vinha em três ou quatro dias. A epidemia ficou conhecida entre os nativos como
“cocoliztli”, mas somente agora, quase meio século depois, o culpado foi
conhecido: a salmonela.
Relatos históricos indicam que a
“cocoliztli” — “pestilência”, na língua asteca — matou cerca de 15 milhões de
astecas, cerca de 80% da população total. Por anos, cientistas tentaram
identificar a doença causadora da epidemia, a segunda maior da história da
Humanidade, atrás apenas da peste negra, que matou 25 milhões de pessoas apenas
na Europa Ocidental no século XIV.
— A “cocoliztli” de 1545-50 foi uma
das muitas epidemias que afetaram o México após a chegada dos europeus, mas foi
especificamente a segunda de três epidemias a mais devastadora — explicou
Ashild Vagene, da Universidade de Tuebingen, na Alemanha, à AFP. — A causa
dessa epidemia tem sido debatida por mais de um século por historiadores e
agora nós temos como fornecer evidência direta pelo uso do DNA para resolver
esta antiga questão.
Os colonizadores europeus trouxeram
para a América novas doenças, como varíola, sarampo, tifo e caxumba. Sem
defesas, os organismos dos indígenas sucumbiam rapidamente. Duas décadas antes
da “cocoliztli” de 1545, uma epidemia de sarampo matou entre 5 milhões e 8
milhões de indígenas, logo após o desembarque dos europeus. Uma segunda
epidemia, entre 1576 e 1578, matou metade da população restante, estimada em
apenas 4 milhões.
“Nas cidades e grandes vilas, valas
foram escavadas. E da manhã ao pôr-do-Sol, os sacerdotes nada fazem além de
carregar cadáveres e jogá-los nas valas”, escreveu o cronista Frei Juan de
Torquemada.
Até mesmo na época, médicos apontavam
que os sintomas não se encaixavam com os das doenças mais conhecidas, como
sarampo e malária. Para responder a essa questão centenária, arqueólogos
analisaram 29 corpos enterrados no sítio de Yucundaa-Teposcolula, em Oaxaca, no
México. Datações por carbono indicam que os indígenas morreram na época da
epidemia, e em seus dentes guardaram provas do patógeno culpado. Exames de DNA
indicaram a presença da bactéria Salmonella enterica, Paratyphi C.
— Nós testamos para todas as bactérias
patógenas e vírus com dados genéticos disponíveis — disse Alexander Herbig,
também da Tuebingen, coautor da pesquisa publicada na revista “ Nature Ecology
and Evolution”. — E a Salmonella enterica foi o único germe detectado.
Este subtipo da salmonela provoca
febres entéricas, dentre as quais a febre tifoide é a mais conhecida. Hoje,
esta variedade da salmonela é muito rara, e os poucos casos de infecção são
registrados na Ásia e na África, não nas Américas.
Agora, resta saber se a salmonela foi
trazida para o Novo Mundo pelos conquistadores espanhois, como outras doenças.
A tese dos pesquisadores é que a bactéria tenha viajado com animais domésticos
trazidos pelos europeus e se espalhado entre os indígenas por meio de água e
alimentos contaminados.
— Com os dados que temos não podemos
saber geneticamente se a salmonela veio da Europa ou já existia no México antes
da chegada dos europeus — pontuou Ashild, ao “El País”. — O que sabemos é que
esta bactéria já existia na Europa muito tempo antes da epidemia de
“cocoliztli”.
Fonte: O Globo
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